Um decreto presidencial assinado em 19 de setembro deve impactar a vida de quilombolas e agricultores que vivem em Coxilha e Sertão, no norte gaúcho. O ato n° 12.186 autoriza a desapropriação de áreas particulares que estejam no território do Quilombo de Arvinha.
Com a determinação, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) poderá passar a titulação da área de 388,7 hectares para a comunidade quilombola local, formada por 33 famílias. Contudo, o decreto cria um impasse com agricultores que já vivem no território.
Dados do Incra mostram que a área ocupada pela comunidade atualmente é de 24 hectares. De acordo com a presidente da Associação dos Remanescentes Quilombolas de Arvinha, Eva Daniele da Silva de Souza, o aumento significativo de 364,7 hectares na área do quilombo representa melhoria na vida dos moradores.
— O território é pequeno para todos, mas mesmo com pouco espaço, vivemos e trabalhamos para nossa subsistência. A comunidade está muito feliz que finalmente saiu o decreto depois de tantos anos, estão todos com a esperança renovada — afirmou.
Agricultores discordam
Na outra ponta, estão os agricultores que não concordam com a decisão federal. Para a presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais, Marinês Scapini Penz, a decisão causa apreensão entre os produtores.
— Fizemos uma reunião para ouvir esses agricultores, que estão inseguros e disseram não saber da existência desse processo. Estamos tentando levar adiante uma articulação política para reverter o decreto — disse.
Apesar da oficialização, a desocupação das terras não deve ser imediata. Segundo o Incra, haverá vistorias de avaliação das propriedades, com levantamento dos valores das terras e das benfeitorias a preço de mercado, a fim de definir as indenizações aos moradores.
Depois de garantidos os recursos orçamentários necessários para o pagamento das indenizações, a autarquia deposita os valores em conta judicial e convoca os proprietários para um acordo extrajudicial.
Caso os proprietários aceitem os valores depositados, é assinado acordo e os recursos podem ser sacados, sendo a área transferida para o Incra. Se os moradores não concordarem com os valores, devem entrar com ações judiciais, questionando somente os valores. Conforme o instituto, o território já está definido e não há possibilidade de permanência no local, uma vez que as ações são de desapropriação.
Ainda segundo o órgão, a área só poderá ser usufruída pela comunidade com a imissão de posse pelo Incra, ou seja, após a conclusão das ações.
Os proprietários com título de domínio com registro no cartório de Registros de Imóveis devem ser indenizados em suas terras e benfeitorias a preço de mercado. Os que possuem apenas posse, serão indenizados em suas benfeitorias, também em valores a preço de mercado. Ao todo, nove imóveis devem ser desapropriados. Desses, oito possuem registro e um apenas posse.
Histórico do quilombo
As origens da comunidade Arvinha remontam à mulher escravizada Cezarina Miranda, que teve cinco filhos com o coronel Francisco de Barros Miranda. Estudos apuraram que em 1889 o Coronel vendeu 77 hectares a Cezarina, que não pagou — uma forma de garantir o sustento dos filhos sem reconhecer a paternidade. O inventário de Cezarina aponta esta compra de terras.
A história da comunidade foi resgatada para a regularização do território pelo Incra. O processo foi aberto em 2005 e o Relatório Técnico Identificação e Delimitação (RTID) do território, com todos os levantamentos e estudos realizados, foi publicado em 2009.
O laudo antropológico foi elaborado por uma equipe da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), contratada pela Fundação Cultural Palmares e pela então Secretaria Estadual de Trabalho, Cidadania e Assistência Social do Rio Grande do Sul, tendo sido complementado pela antropóloga do Incra/RS, Bethânia Zanatta.
Próximo ao Quilombo da Arvinha, o Quilombo da Mormaça também aguarda a titulação das terras, mas ainda sem data para receber o documento. Apesar disso, os dois territórios foram reconhecidos como comunidades remanescentes de quilombos pela Fundação Cultural Palmares em 2004.
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Fonte:
GZH / Passo Fundo
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