Nas manhãs de domingo, o silêncio se materializa nesta tela branca, onde me sinto autorizado, pelo vazio externo e pelo embalo infinito das teclas, a revisitar toda e qualquer memória que faça do domingo o que ele é: sagrado.
Começando pelos amigos da noite que, pelo sacro de uma festa que não cessa, de algum lugar inimaginável há poucas horas, assistem religiosamente ao nascer de mais um domingo. Ou então, aqueles que veem os primeiros raios de sol com roupas esportivas e talvez até se indignem com os que viraram a noite. Aqui, os extremos, mesmo que apenas pelos olhos, se encontram.
Nesses sagrados domingos, há também os adeptos da contemplação. Diante de uma janela aberta, observam o tímido movimento da oferta semanal: o orvalho da manhã, a neblina encobrindo alguma coxilha ao longe, misturando-se aos primeiros sinais dos rituais religiosos do churrasco dominical. A água quente borbulhando no mate, e a fumaça que rompe a frieza matinal.
Há os adeptos do sono sem prazo de validade, que se presenteiam com tempo e espaço aos incansáveis sonhos do domingo. Há ainda quem se entregue ao seu mais melindroso ritual de autocuidado, vista sua melhor roupa e vá celebrar sua fé, congregar. Há aqueles que simplesmente caem da cama e lá estão, ou os que religiosamente seguem para o bar aos domingos. Quem, entre esses, está habilitado a condenar o sagrado domingo do outro?