Todo tapejarense que teve a sorte de uma infância analógica já foi salvo pelo Machado Bicicletas. Essa lenda urbana, forjada ao longo de mais de três décadas por dois irmãos, até hoje, a meu ver, é um dos espaços profissionais mais importantes da nossa cidade.

Quantos natais foram mais felizes por causa de uma bicicleta? Quantas crianças experimentaram tirar as rodinhas e aprender a se equilibrar? Quantas aprenderam a cair e se levantar? Quantas deixaram o sedentarismo ao descobrirem o vento no rosto?

Nesta semana, fui surpreendido na minha conexão mais íntima com a cidade pela notícia sobre a tragédia que queimou a casa construída pelos irmãos Machado. Minhas fontes me alertaram de um prejuízo financeiro monumental. Por providência, Marcos agiu a tempo para, além de preservar o mais importante, também salvar o seu trabalho e o seu histórico Gol quadrado. Todo tapejarense raiz conhece aquele carro.

Quando soube, imediatamente, com a ajuda das minhas fontes próximas, me inteirei de que há uma vaquinha online e uma rifa girando em benefício dessa reconstrução. Eu sei que toda tragédia é irrecuperável ao seu estado original. Porém, aprendi que toda perda dá lugar a algo novo, quem sabe até melhor, e o espírito gaúcho sabe bem disso.

Me lembro bem, há mais de duas décadas, do puxadinho de bloco de tijolo, no qual eles consertaram várias vezes minha bicicleta velha a preços simbólicos. Ou de passar por lá, tarde da noite e, ainda, os encontrar trabalhando. Ou, das invenções ao estilo Professor Pardal de todas as espécies. Foi lá que eu vi a primeira bicicleta motorizada. Ou do grupo de ciclismo criado por eles. Mas o que mais me pegava era que, quando sonhava, de noite ou de dia, era com aquelas bicicletas.

Uma das minhas memórias de bicicleta remonta a uma daquelas tardes chuvosas de verão, quando ainda não existia para mim resfriado. Acompanhado de uma das minhas comparsas, estava lá eu pedalando como um maluco na chuva. Ela, despretensiosamente, jogou um cabo de vassoura que atravessou os raios da frente e travou de solavanco a bicicleta, me fazendo voar pela frente. Que cena! Tragédias acontecem. Não deixarei de pedalar. Os irmãos Machado não vão parar de consertar sonhos.

Se eu puder deixar apenas um conselho: compre uma bicicleta com os irmãos Machado. Quem sabe, ainda dê tempo de viver seu sonho de criança.