Goleiro relatou ofensa racista de torcedores adversários
O clássico entre Associação de Futsal e Cultura de Seberi (Afucs) e Guarani Futsal, de Frederico Westphalen, foi interrompido após denúncia de racismo, no sábado (31).
O jogo válido pela 11ª rodada da primeira fase do Gauchão de Futsal acontecia em ginásio de Seberi, na Região Norte, quando o treinador Raphael Melo e o goleiro Léo Silva, da equipe de Frederico Westphalen, relataram à arbitragem que torcedores da Afucs gritaram xingamentos racistas atrás do gol e nas arquibancadas.
Conforme o Guarani, as ofensas aconteceram quando Silva e Melo saíram do vestiário para começar a etapa final do jogo. Por isso, a disputa foi interrompida aos 9 segundos.
Conforme o goleiro Léo Silva, o torcedor o chamou de "preto" três vezes em tom pejorativo. Na terceira vez, ele chamou o técnico, que parou a partida.
Aos 27 anos, o atleta é natural de Fortaleza (CE) e atua no Guarani há menos de 60 dias. Segundo ele, essa foi a primeira vez que sofreu racismo em quadra.
Depois que a partida foi interrompida, a equipe voltou para o vestiário e não houve condições de retomar o jogo. Os jogadores tomaram banho e, ao ir embora, o treinador Raphael foi ofendido por duas pessoas que estavam na arquibancada.
— Disseram “não pode mais chamar de preto? E você é o que? É preto ou pretinho?” — contou o goleiro à reportagem.
O relato é confirmado pelo técnico. Melo estava com familiares no ginásio, incluindo sua filha e esposa. No fim da partida, ele pegou a criança no colo para acalmá-la e, ao voltar para a quadra enquanto os jogadores se arrumavam, foi atacado com ofensas pelos torcedores.
— Quando passei por um portão, um senhor se dirigiu a mim perguntando: “então não pode mais chamar de pretinho ou preto?”, dentre outras ofensas. Eu até meio que não acreditei no que estava ouvindo, ainda mais com minha filha no colo e porque a partida já havia sido encerrada — disse.
Natural de Recife (PE), Melo tem 32 anos e está no seu primeiro ano como técnico do Guarani, mas vive no Rio Grande do Sul há seis anos. De acordo com ele, esse é o segundo caso de racismo que enfrenta no RS — os dois no mesmo ginásio de Seberi:
— Na primeira ocasião fui ofendido por um atleta que depois pediu desculpas e deixei passar. Agora o racismo se repete no mesmo ginásio e, por incrível que pareça, no mesmo canto (da quadra) que da outra vez.
O fato de já ter sofrido ofensas racistas antes fez com que Melo decidisse sair do jogo e não retornar para a partida.
— Depois do Léo sofrer a primeira ofensa, retirei a equipe e já disse para tomarem banho, pois não daríamos seguimento no jogo. Todos os atletas concordaram — declarou.
Torcedores já foram identificados, diz Guarani
Em nota, o clube declarou que os torcedores já foram identificados, que o clube dá o suporte necessário aos atletas e que um boletim de ocorrência foi registrado na Polícia Civil.
Ainda no sábado (31), a Afucs divulgou uma nota oficial (leia a íntegra abaixo) onde lamentou o ocorrido e reforçou que não concorda com a atitude racista.
Para GZH Passo Fundo, o presidente do clube, Dione Junges, relatou que o time de Seberi foi pego de surpresa quando viu a equipe adversária sair da quadra. Depois de conversar com a arbitragem, a direção abordou os torcedores.
— Um menino de 14 anos veio até a grade e assumiu a autoria dos xingamentos. Ele disse que fez isso depois do goleiro adversário mostrar o dedo do meio para ele. Protegendo a identidade do menor, retiramos ele do ginásio — afirmou Junges.
Segundo o diretor, o goleiro foi procurado para que o menino lhe pedisse desculpas, mas o atleta não aceitou.
— Após identificar o torcedor e retirar ele de quadra, a arbitragem nos deu condições de sequência de jogo. Mesmo assim, o Guarani se negou a voltar — completou Junges.
O diretor de futebol do Guarani, Euzebio Lavratti, apresenta outra versão sobre o caso.
— Quem proferiu as ofensas ao nosso goleiro foi um cara barbudo, que aparentava ter entre 20 e 22 anos. Não foi um menor, como a Afucs está relatando. Além desse homem, outros dois adultos, senhores de idade, também foram vistos proferindo ofensas contra nosso treinador quando estávamos nos retirando do ginásio. Nosso time não tinha mais condições psicológicas para voltar após goleiro e treinador serem ofendidos — relatou.
— Me chamaram para reconhecer o torcedor. Eu fui, reconheci a pessoa e mesmo assim estavam culpando o moleque. Parece que botaram o menino para assumir a culpa e não dar tantos problemas para o clube da casa — completou Raphael.
Súmula ainda não foi divulgada
A súmula da partida ainda não foi divulgada, o que deve acontecer no decorrer da semana.
Além disso, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva e o Tribunal de Justiça da Liga Gaúcha de Futsal analisarão os fatos e decidirão o que será feito em seguida, uma vez que não está claro se a partida será retomada, se haverá um vencedor ou empate.
Conforme o presidente da Liga Gaúcha de Futsal, Nelson Bavier, a procuradoria deve ter em mãos ainda nesta segunda-feira (2) os relatórios da arbitragem e do representante de quadra para dar o devido encaminhamento do caso.
Sobre a partida ter sido interrompida, a entidade afirma que essa é uma decisão do TJD e que, enquanto executivo, a liga não pode tomar nenhuma decisão.
— Sobre nosso posicionamento enquanto entidade, é que repudiamos totalmente este ato — declarou o presidente.
Leia as notas na íntegra
Guarani Futsal
“NÃO TOLERAMOS MAIS RACISMO!
O Guarani Futsal vem prestar sua solidariedade ao atleta Léo Silva, e ao treinador Raphael Melo, vítimas de injúria racial na partida de hoje, 31, em Seberi.
Léo no início da etapa final, e o nosso treinador, quando estávamos deixando o vestiário. Por mais uma vez nos deparamos com esses casos no esporte. Precisamos inibir tudo isso. Os torcedores já foram identificados.
Léo Silva e Raphael, estamos com vocês! Não podemos mais tolerar esse tipo de atitude seja no esporte ou na sociedade."
Afucs
"NÃO AO RACISMO!
Na noite de hoje (31) tivemos um incidente triste em Seberi, o goleiro do Guarani, Leo Santos, sofreu um ato de racismo no início da segunda etapa. O autor foi identificado pelo atleta, e mesmo sendo menor de idade, foi retirado do Ginásio.
O Guarani se retirou de quadra e optou em não retornar, mesmo com a identificação do menor de idade.
Lamentamos o ocorrido, e reforçamos que não concordamos com essas atitudes, as quais não devem mais fazer parte do esporte.
Força Léo Silva."
Fonte: Zero Hora Passo Fundo
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